Toca Raul #2: Conheça mais cinco discos da obra do “Maluco Beleza”

Na última segunda-feira (28), Raul Seixas teria completado 76 anos. Para comemorar esta data, o NEXP preparou dois textos comentando a obra do “Maluco Beleza”. Confira a segunda e última parte desta série. Toca Raul!

Sociedade da Grã-Ordem Kavernista apresenta: “Sessão das 10” (CBS, 1971)

Após o fracasso do único álbum do grupo Raulzito e Os Panteras (EMI-Odeon, 1968), Raul foi levado por Jerry Adriani (1947-2017) à gravadora CBS (atual Sony Music) para trabalhar como diretor e compositor. Produziu artistas oriundos Jovem Guarda, alguns deles considerados “bregas” pela crítica, como Odair José, Wanderley Cardoso, Diana, Renato e seus Blue Caps e Leno, com quem trabalhou no icônico Vida e Obra de Johnny McCartney (Sony, 1995), lançado apenas nos anos 1990 por ter sofrido problemas com a censura em 1971, ano em que o álbum foi gravado.

Apesar de estar financeiramente estabilizado, Raul estava insatisfeito com os rumos que sua carreira havia tomado e ainda sonhava com o sucesso como cantor. Esse desejo só aumentou ao conhecer o compositor capixaba Sérgio Sampaio (1947-1994), contratado por Raul para a gravadora. Na mesma época, ele também conheceu Edy Star. Com os dois, começou-se a vislumbrar uma nova banda e Edy trouxe Miriam Batucada (1947-1994) para compor o projeto.

Planejado como um álbum conceitual, o trabalho foi batizado de Sociedade da Grã-Ordem Kavernista apresenta: “Sessão das 10” e gravado às escondidas, pois a CBS não acreditava no potencial de Raul como artista. O disco apresenta diversas composições em parceria com Sérgio Sampaio, como “Êta Vida”, o rock com toques nordestinos “Quero Ir” e a viajante “Eu Vou Botar pra Ferver”.

Outros destaques do álbum são a seresta “Sessão das 10”, a balada “Eu Não Quero Dizer Nada”, ambas interpretadas por Edy, “Eu Acho Graça” e “Todo Mundo Está Feliz”, cantadas por Sérgio, “Aos Trancos e Barrancos”, samba composto por Raul, a psicodélica “Dr Pacheco”, “Chorinho Inconsequente” e “Soul Tabarôa” da dupla Antônio Carlos & Jocafi, ambas interpretadas por Miriam. Outra característica inusitada do trabalho são as vinhetas entre as canções, influenciadas por Frank Zappa (1940-1993).

Inúmeras lendas cercam o álbum. Entre elas, os gastos da gravação – estimado em 24 milhões de cruzeiros – e a história que Raul teria sido demitido logo após o lançamento do projeto. O fato é que Sociedade da Grã Ordem Kavernista foi retirado de catálogo pouco tempo depois, tendo pouquíssima repercussão. Foi relançado em CD somente na década de 1990 em tiragens pequenas e recebeu uma edição especial em LP pela série Clássicos em Vinil da Polysom em 2018. O álbum não está presente nas plataformas de áudio.

Há 10 Mil Anos Atrás (Phillips, 1976)

Um dos momentos altos da carreira de Raul, Há 10 Mil Anos Atrás foi o último lançamento do cantor pela Phillips, gravadora onde estava desde 1973.

Lançado no final de 1976, o álbum é uma retomada aos “assuntos místicos” deixados de lado em Novo Aeon (Phillips, 1975). A gravadora também queria um trabalho mais comercial e pressionou Raul durante as sessões, que foram tensas. Em alguns dias, ele se recusava a gravar e aparecia embriagado no estúdio.

Apesar dos problemas e da fria recepção por parte da crítica, o álbum obteve o resultado comercial esperado através de músicas como “Eu Nasci Há 10 Mil Anos Atrás” e “Eu Também Vou Reclamar”, uma crítica às canções de protesto, com direito a alfinetadas em Sílvio Brito, Hermes Aquino e Belchior (1946-2017), que faziam grande sucesso naquele período.

O disco também traz o tango “Canto Para Minha Morte”, uma versão hard rock de “As Minas do Rei Salomão”, gravada originalmente em Krig-ha, Bandolo! (Phillips, 1973), “Meu Amigo Pedro”, composta em homenagem a seu irmão Plínio, “O Dia da Saudade”, a belíssima “Ave Maria da Rua”, o xote “Os Números” e as baladas “Quando Você Crescer”, “O Homem” e “Cantiga de Ninar”.

O Dia em que a Terra Parou (WEA, 1977)

Primeiro lançamento de Raul pela Warner Music, o álbum O Dia em que a Terra Parou representa uma forte ruptura em sua carreira. O cantor encerrou sua pareceria com Paulo Coelho e o trabalho traz a presença do compositor Cláudio Roberto em todas as faixas.

Apesar de não ter sido bem recebido pela crítica e de não ter atendido as expectativas comerciais da gravadora, o disco também é um dos pontos altos da carreira de Raul , contendo o hino “Maluco Beleza” e a faixa título, que tiveram ótimas execuções nas rádios de todo o Brasil.

“Maluco Beleza”, que tornou-se um dos apelidos de Raul, foi inspirada na vida de Cláudio Roberto, pois era visto como “doido” na cidade onde residia, Miguel Pereira, localizada no interior do estado do Rio de Janeiro. Recentemente, a música “O Dia em que a Terra Parou” voltou a ser lembrada nas redes sociais em decorrência da pandemia de COVID-19.

O álbum traz outros destaques como “Tapanacara” e “De Cabeça pra Baixo”, ambas com a participação da Banda Black Rio, o iê-iê-iê “Eu Quero Mesmo”, “Sapato 36”, “No Fundo do Quintal da Escola”, o bolero “Você”, o baião “Que Luz é Essa?” e a balada “Sim”.

O Dia em que a Terra Parou foi relançado no final da década de 1980, quando Raul voltou à Warner Music para gravar seu último disco, A Panela do Diabo, ao lado de Marcelo Nova.

Raul Seixas (Eldorado/EMI-Odeon, 1983)

Após ficar três anos longe dos estúdios e enfrentar diversos problemas para manter sua carreira, Raul Seixas volta com um disco homônimo, lançado pela gravadora paulistana Eldorado com distribuição pela EMI-Odeon.

Desde que saiu da CBS, onde havia lançado o álbum Abre-te Sésamo em 1980, Raul tentava voltar ao cenário musical. Fez um show histórico em 1982 no Festival de Verão de Santos, para uma plateia de 180 mil pessoas e ofereceu para diversos produtores um projeto intitulado Nuit, uma ópera rock feita em parceria com sua então esposa Kika Seixas, contando a história da Deusa da Noite de Thelema, religião criada por Aleister Crowley (1875-1947) no início do século XX. Nenhuma gravadora teve interesse, exceto o selo Eldorado, que contratou o cantor no início de 1983.

Com algumas canções que estariam em Nuit e outras que fugiam do conceito do projeto, Raul entrou em estúdio e iniciou o que é considerada por muitos, a última fase de sua carreira. A convite de Augusto César Vannucci (1934-1992), compôs “O Carimbador Maluco” que entrou no especial infantil Plunct, Plact, Zuuum, exibido pela Rede Globo em junho de 1983. Apesar do álbum já estar pronto, a gravadora quis incluir a canção no projeto, que veio em um compacto bônus junto com o disco. A música tornou-se um grande sucesso, garantindo o segundo disco de ouro da carreira de Raul e um breve retorno a grande mídia. O trabalho foi tão bem sucedido que Raul foi contratado pela gravadora Som Livre no final daquele ano.

Bem recebido pela crítica, traz canções mais leves como a folk “Coisas do Coração”, as baladas “Coração Noturno”, “Lua Cheia” e “Segredo da Luz”, a latina “Eu Sou Eu, Nicuri É o Diabo”, um flerte com a música nordestina em “Capim Guiné” e “Quero Mais”, essa última com a participação de Wanderléa. O rock and roll também está presente em “D.D.I. (Discagem Direta Interestelar)”, “Aquela Coisa”, “Babilina” e na genial “Não Fosse o Cabral”, além de uma versão ao vivo da música “So Glad You’re Mine”, de Arthur Crudup, regravada por Elvis Presley.

Metrô Linha 743 (Som Livre, 1984)

Gravado em 1984, Metrô Linha 743 foi o único trabalho de Raul lançado pela Som Livre. Com a sonoridade predominantemente folk, é considerado por alguns o primeiro álbum acústico da história do rock nacional, muito antes do formato invadir as paradas de sucesso através da MTV Brasil, em meados da década de 1990.

Raul buscava um conceito bem amarrado para o disco, com a capa e o encarte todo em preto e branco, com referências a Alfred Hitchcock (1889-1980) e George Orwell (1903-1950), autor do livro Nineteen Eighty-Four (1984).

Além das regravações de “O Trem das Sete” e “Eu Sou Egoísta” (trazendo citações a Bob Dylan e Caetano Veloso), o álbum é formado por músicas em parceria com Kika Seixas, Cláudio Roberto e com o guitarrista Rick Ferreira. Destaque para a faixa título Metrô Linha 743″, comparada a “Ouro de Tolo” e “Highway 61 Revisited” de Bob Dylan, canções fortes como “Um Messias Indeciso”, “Quero Ser o Homem Que Sou (Dizendo a Verdade)”, “Canção do Vento”, “Mamãe Eu Não Queria”, os rocks “Meu Piano”, “A Geração da Luz” e o country romântico “Mas I Love You (Pra Ser Feliz)”.

Apesar da baixa vendagem, Metrô Linha 743 foi bem recebido pela crítica especializada e até os dias atuais, é um dos trabalhos mais elogiados de toda a trajetória de Raul. Foi relançado em CD pela Som Livre em 2003, incluindo a música “Anarkilópolis” como faixa bônus. Em 2018 recebeu duas edições especiais em LP feitas pelo 180 Selo Fonográfico em parceria com a Record Collector Brasil. Uma tiragem com vinis pretos e outra com discos transparentes.

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