Opinião: Vitória de Chloé Zhao por melhor direção no Oscar é uma conquista para as mulheres e para o cinema

No último domingo (25), aconteceu a premiação do Oscar 2021 e o NEXP contou tudo sobre a noite mais famosa de Hollywood. O grande vencedor foi “Nomadland”, da chinesa Chloé Zhao, ganhando três categorias: Melhor Filme, Melhor Atriz para Frances Mcdormand e Melhor Direção para Zhao. O filme é um drama sobre uma mulher na casa dos 60 anos que, depois de perder tudo na Grande Recessão, embarca em uma viagem pelo Oeste americano, vivendo como uma nômade moderna.

Segundo diversos sites de notícias, as menções à diretora na rede social chinesa Weibo (semelhante ao Twitter) desapareceram e a imprensa chinesa não se pronunciou sobre sua vitória. No começo de março, ela virou alvo de ataques de nacionalistas chineses nas redes sociais, que desenterraram entrevistas em que ela parecia criticar o país natal. A população chinesa pensa ao contrário. À AFP, agência de notícias francesa, a engenheira Yan Ying declarou que Zhao é o orgulho do povo chinês e que é muito raro que um chinês receba um Oscar.

Pelo especial da semana da mulher aqui no NEXP, lá em março, publiquei uma matéria sobre como as diretoras mulheres são minoria nas premiações: em 93 anos de Oscar, apenas cinco tinham sido indicadas. Nenhuma era negra ou latino-americana. A única vencedora em toda a história foi Kathryn Bigelow, pelo filme “The Hurt Locker” (2008).

Até este ano, quando Chloé Zhao venceu, se tornando, portanto, a primeira asiática e a segunda mulher a vencer a categoria. Emerald Fennell também estava indicada por “Promising Young Woman” (2021).

Certamente, é uma vitória para todas as diretoras, cineastas, produtoras e atrizes ― e até mesmo para quem não está nesse ramo ― que uma de nós consiga vencer essa categoria e contestar as estatísticas vergonhosas da Academia, que gosta tanto de se manter fiel aos tradicionalismos: homens, brancos e héteros vencendo (por mais batido que esse argumento soe, infelizmente é o retrato da realidade).

Para além disso: essa vitória, mesmo que pareça pequena por ser “apenas” a segunda mulher a vencer, começa a moldar o tipo de cinema, os tipos de filmes e os tipos de história que se consumirá daqui pra frente, todos com uma perspectiva feminina. Ninguém mais aguenta ver a visão de mundo dos homens, por mais “mente aberta” que eles sejam.

Isto é, não quero dizer que tudo que será dirigido por mulheres sempre será isento de críticas, será de qualidade impecável, socialmente e politicamente justo, até porque isso seria uma grande ilusão (apesar de que eu não duvido que existam algumas impecáveis). E sim, que é totalmente diferente quando passamos a consumir conteúdo produzido por figuras femininas e com protagonistas femininas. Se você quer assistir a mais filmes dirigidos por mulheres, sugiro o site MoviesByHer.

Além de “Nomadland”, Chloé já dirigiu “Songs My Brothers Taught Me” (2015) e “The Rider” (2017). Em setembro de 2018, a Marvel a contratou para dirigir e roteirizar “Os Eternos”, filme baseado nos quadrinhos de mesmo nome. Estava agendado para ser lançado nos Estados Unidos em 6 de novembro de 2020 e 5 de novembro no Brasil, mas foi adiado por conta da pandemia. Agora, o lançamento está programado para 5 de novembro de 2021.

 

Confira o discurso da diretora ao vencer o Oscar no domingo:

“Obrigada à Academia, obrigada aos meus brilhantes companheiros de indicação.

A toda a minha equipe de Nomadland: que jornada louca e única nós fizemos juntos. Muito obrigada, sou tão grata a vocês.

Recentemente, tenho pensado muito sobre o que me faz seguir em frente quando as coisas estão difíceis. E acho que está ligado a algo que aprendi quando era criança. Crescendo na China, meu pai e eu costumávamos brincar de memorizar poemas e textos clássicos chineses. Cantávamos juntos e tentávamos finalizar a frase do outro.

Me lembro com muito carinho de um destes textos, chamado Three Character Classic. O primeiro verso diz: ‘人之初 性本善’, que significa, ‘Ao nascer, as pessoas são inerentemente boas’. Essas seis letras tiveram um impacto muito grande em mim quando era criança, e continuo acreditando nelas.

Às vezes, o oposto parece ser verdade, mas sempre encontrei bondade nas pessoas que conheci, em todos os lugares do mundo a que fui. Então, este prêmio é para qualquer pessoa que tem fé e coragem para se agarrar à bondade dentro delas e à bondade dos outros, mesmo quando é muito difícil fazer isso. Esse prêmio é para vocês. Vocês me inspiram a seguir em frente. Obrigada.”