O Som do Silêncio: a performance de Riz Ahmed e a capacidade de ressignificar a vida.

O silêncio absoluto, para quem conhece e vive  com todos os sons, dos mais irritantes  aos mais bonitos, deve ser o mais ensurdecedor e agoniante. Agora, imagina esse mesmo cenário para um músico, mais precisamente um baterista, aquele que comanda o som mais alto de todos os instrumentos. Não consegue imaginar? 

O filme O Som do Silêncio, com esse nome recheado de significado, nos faz pensar esse cenário e chegar perto de (tentar) entender o que seria passar por isso. Esse é o novo filme da Amazon Prime, que estreou no fim do caótico 2020, e conquistou diversas indicações, críticas e reflexões sobre os infortúnios que rodeiam a vida humana.

A produção é dos Estados Unidos e da Bélgica e conta a história de um baterista metaleiro, Ruben, que perdeu sua audição de forma muito rápida e inesperada. Como uma pessoa que tem o seu estilo de vida regrado pelas batidas de sons, ele perde seu chão. Diante dessa situação, junto com Lou, sua namorada, eles encontram uma comunidade de pessoas surdas que aceitaram e vivem em paz com a condição que lhes foi imposta. Mas para um músico visceral, Ruben precisa decidir se vai aceitar essa condição ou se vai fazer o impossível para ter sua carreira (e seu estilo de vida) de baterista de volta. 

Riz Ahmed como Ruben em Sound of Metal.

Ruben é um personagem de extrema coragem, pois é colocado frente a mais um desafio, após se tornar um ex dependente químico, que desestrutura qualquer perspectiva de algo remotamente parecido com sua antiga vida e suas relações. Afinal, quem somos nós quando o que nos define deixa de existir como possibilidade? 

A ótima performance de Riz Ahmed, ator e rapper anglo-paquistanês de 38 anos, mostra todas as faces mais reais, naturais e instintivas do ser humano quando deparado com uma adversidade: a raiva, a incompreensão e a vontade urgente de consertar a situação. O ator incorpora a vida de Ruben, que em alguns momentos se torna uma existência angustiante.

Ahmed disse ao jornal USA Today, em uma entrevista, que durante as filmagens de algumas cenas ele usou bloqueadores dentro do seu canal de audição, e assim não conseguia ouvir nada, nem o som de sua própria voz. Além disso, o ator se dedicou durante sete meses a aprender a Linguagem de Sinais Americana e a tocar bateria. O destaque de Riz Ahmed é fortemente cotado  ao  Oscar de 2021 na categoria de melhor ator. (A cerimônia deste ano foi adiada do dia 28 de fevereiro para o último domingo de abril, dia 25, devido a pandemia). 

O filme coloca brilhantemente o telespectador na perspectiva do personagem, em um universo de dúvidas, medos e silêncio de sua mente, onde os sons falham, somem e se tornam esquisitos demais para suportar, onde você se pergunta até que ponto alguns sacrifícios e buscas incessantes na vida valem a pena. Além disso, o diretor Darius Marder colocou alguns atores surdos em papéis importantes do filme com o objetivo de realmente integrar Ruben à comunidade surda e trazer essa realidade para Hollywood. 

O início do filme se dá com Ruben tocando bateria e um barulho extremamente alto, apenas para terminar com o mais profundo silêncio. O que se ouve no silêncio? E nos novos começos que a vida nos impõe? Essas talvez sejam as reflexões mais importantes que a trajetória de Ruben nos traz, com muita sensibilidade. O final foge de todos os clichês de histórias de superação, em que a (surpreendente) última cena  resume em um ato a busca, de exatas 2 horas e 1 minuto, do filme. Eu garanto, vale a pena conferir se você concorda comigo.