Praticamente todo Geek conhece alguma obra cuja radioatividade tem um papel fundamental no enredo. Seja uma aranha radioativa que morde um jovem fotógrafo jornalista, transformando-o no Homem-Aranha ou até mesmo a radiação emitida pela queda de um satélite acordando zumbis famintos por cérebros, como em “A Noite dos Mortos-Vivos”.
Mas quanto da realidade sobre a radiação e suas terríveis consequências é exposto em filmes e séries? Desde os efeitos colaterais sentidos por Marie e Pierre Curie na primeira década de 1900 até desastres em usinas nucleares, como o acidente que ocorreu em Chernobyl, em 1986, sabemos que a exposição a partículas radioativas é perigosa e letal para os seres vivos. E essa não é uma realidade distante de nós: aqui mesmo no Brasil, em 1987, apenas um ano depois do desastre de Chernobyl, aconteceu um acidente radiológico em Goiás. Dois catadores de lixo entraram em uma clínica abandonada, encontraram uma máquina de radioterapia, a desmontaram e encontraram um cilindro que venderam para um ferro-velho. O problema é que a capsula continha 19 gramas de césio-137, altamente radioativo, gerando uma contaminação em massa na cidade de Goiânia.
O que o mundo do audiovisual tem a nos dizer sobre isso? Hoje há certos filmes e séries, alguns deles de caráter documental, que nos dão uma perspectiva bastante pautada na realidade a respeito da ameaça biológica que é a radioatividade. Mas antes de seguir a lista, é preciso avisar que alguns deles exigem um pouco de estômago forte.
Reação Nuclear (2022) – minissérie, Netflix.
Em 1979 ocorreu um grave acidente em uma usina de energia nuclear dos Estados Unidos, em Three Mile Island, na Pensilvânia. A série, originalmente chamada de “Meltdown: Three Mile Island”, é na realidade um documentário de Kief Davidson que acompanha o acidente e as consequências diretas da radiação que escapou das instalações da usina, contaminando uma área de até 16 quilômetros em volta de Three Mile Island. “Reação Nuclear” conta também com depoimentos de moradores da região e funcionários da usina.
A qualidade Netflix está presente em cada episódio da minissérie, incluindo a bem executada dramatização de certos eventos. Uma pincelada de política, citando a Guerra Fria e uma coincidente relação com o cinema da época, que lançara naquele mesmo ano “Síndrome da China”, um filme sobre um acidente com Jane Fonda, contribuem para manter um estilo artístico dessa série, cujo clima central pende ao sombrio.
Radioativo (2019) – Filme.
Estrelado pela premiada atriz Rosamund Pike, “Radioativo” conta a história do evento principal na vida de Marie Curie, explorando com riqueza de detalhes desde as constantes dificuldades em conseguir apoio para suas experiências devido ao fato de ser uma mulher, até o declínio de sua saúde após a constante exposição à radiação, também responsável pela anemia que enfraqueceu seu marido, o também cientista Pierre Curie, levando-o ao acidente que gerou sua morte. Mesmo viúva, Marie mantem-se obstinada em seu trabalho com pesquisa científica, o que lhe rendeu em 1911 o Prêmio Nobel de Química.
O filme britânico é considerado um drama biográfico, baseado no romance gráfico de 2010, “Radioactive: Marie & Pierre Curie: A Tale of Love and Fallout”, de Lauren Redniss. Em momentos chaves da narrativa, cenas que descrevem o impacto futuro de suas descobertas – tanto benéficos quanto maléficos, incluindo radioterapia externa, a bomba atômica de Hiroshima e Nagasaki e o desastre de Chernobyl – pontuam de forma decisiva sua história.
Chernobyl (2019) – minissérie, HBO.
Criada por Craig Mazin, Chernobyl é uma minissérie de drama, que narrava os eventos acerca do acidente nuclear da usina de Chernobyl. Seu formato é de dramatização, não de documentário, se desenvolvendo ao longo de cinco episódios e com uma considerável importância a vertente política da questão – lembrando que na época do desastre a Ucrânia pertencia a União Soviética – sem deixar de abordar com seriedade o elemento humano da tragédia e os esforços de muitos na contenção de danos e apoio às vítimas.
E já que estamos falando da importância da política na trama, é importante salientar que a visão sobre a mesma apresentada na série é sem sombra de dúvida ocidental. Além deste fato, famílias de pessoas que viveram perto da área do desastre na época criticaram a série, a descrevendo como “politicamente motivada e provocativa”. Outras inconsistências foram apontadas por alguns remanescentes da tragédia, como o major-general Nikolai Tarakanov que apesar de elogiar o trabalho da HBO, apontou que o personagem de Legasov – vice-diretor do Instituto Kurchatov indicado para ajudar os esforços de limpeza – não participou de grandes reuniões durante o controle do desastre como foi mostrado na séria.
Mesmo assim, a minissérie Chernobyl é provavelmente o mais relevante ato a respeito desse tipo de tragédia, não só pela qualidade primorosa da produção, mas também pelo geralmente acertado apelo pela realidade do roteiro, além do senso de luto que rege o clima de cada episódio.
Menção honrosa: “Fukushima: Ameaça Nuclear”, é um filme japonês de 2020, sobre o terremoto no litoral do Japão que gerou uma onda de mais de 10 metros. O tsunami inundou os prédios de uma usina nuclear, que começou a superaquecer e aumentar a pressão, tornando eminente o risco de uma grave explosão nuclear. Durante quase sete dias, mais de 50 trabalhadores permaneceram em seus postos de trabalho e arriscaram suas vidas para tentar impedir que desastre fosse ainda pior.
O lado assustador da radiação está presente na história da humanidade antes mesmo de ser constatado de fato. Isso não significa que nós devemos ter sempre medo da radiação, afinal ela está presente no dia a dia da humanidade, seja no fornecimento de energia ou em equipamentos e tratamentos médicos. Mas não custa nada nos manter alertas acerca de seus riscos e as obras supracitadas são excelentes lembretes disso para nós, apreciadores da sétima arte e suas vertentes.